quinta-feira, 22 de julho de 2010

E agora, Setembrino?
O açucar acabô, o fubá se foi
as crianças cum fome, só dorme no tapa.
E Vancê me vem cum fala embolada
dizê qui Deus vê tudinho?
Vancê num acha que Ele tá sofrendo das vista?

- Messody Ramiro Benoliel

quarta-feira, 14 de julho de 2010

"Eu defendo o direito de todo ser Humano ao Pão & à Poesia."

Só fiquei sabendo ontem.
Dia 3/o7 morreu um poeta que eu gostava muito, o Roberto Piva.

"Um maiores nomes da poesia marginal brasileira, o poeta Roberto Piva morreu em São Paulo, no sábado, aos 72 anos. O escritor sofria de Mal de Parkinson e estava internado desde o dia 13 de maio no Instituto do Coração por conta de uma insuficiência renal, que evoluiu para uma falência múltipla de órgãos." - o Globo

"Dêem-me um anestésico. A vida dói e arde.
Não sei controlar meus impulsos demoníacos.
Não acredito em forças de outro mundo.
Sou eu, meus versos e o perigo das frações."

SAN PAULO'S IMPROVISATION - Roberto Piva
.
"Ruas do meu São Paulo,
A culpa do insofrido,
Onde está?"
MÁRIO DE ANDRADE


.
De um bar qualquer
Do Largo do Arouche
assisto São Paulo passar dentro de mim
Imerso na paisagem cinza-úmida
pela "água-benta das garoas monótonas"
como disse Mário de Andrade.
Do bar recorto no asfalto umedecido
o olhar dos pederastas
mariscando colegiais farfalhantes nas esquinas.
O cheiro morno dos Hamburgers
assalta-me
como uma náusea íntima
desprendida do vapor da alma.
Doces olhos das loucuras simples.
"mais um gin, todavia..."
Escorrego pela noite
cavalgando
o Exercito da Salvação:
"Não acham os senhores
que Deus está em toda parte?"
" Por isso mesmo não está
em parte alguma,
grito na minha inocência pagã...
"Malditos sejam os que..."
Escondo-me do mau agoiro.
Duas garotas
em rancheiras azuis
adolescem na calçada
fugidas da neurose territorial
da pequena-burguesia
paulistana.
o peso da solidão
me espreme
para fora de mim.
Recomponho-me na noite
não dando chance
ao mar interior
que urra
de tristeza.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Esses trechos do Fernando Bonassi me fizeram rir da minha própria bronca que tenho de vestibulares. Quem nunca passou por isso? Sorte de quem conseguiu passar logo de primeira.
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"A Fundação de Organnização dos Vestibulares informa que os inscritos no centésimo bilionésimo novo vestibular terão quatro horas para resolver as questões. Só poderão sair após duas horas de iniciado o exame, mesmo tendo terminado antes do tempo. Boa sorte a todos..."
(...)
Faltava uma hora pro tempo se esgotar quando eu terminei. Olhei em torno. Dava para sentir no ar o quanto aquilo era terrivel.(...) Todo mundo alí tinha passado pelo menos onze anos de suas vidas estudando nos mais variados tipos de prisões escolares, caretas e embrutecidas pela repetiçao ad infinitum das mesmas adivinhaçoes sem graça pra, em apenas quatro horas, jogar a sorte do seu destino.
Esqueceu? Dane-se.
Nao se lembra? Lixe-se.
Nao entendeu? Foda-se...

E depois perguntam por que os jovens são uns atrapalhados, por que não querem saber de nada e pulam com dois braços num crack que os alivie... Afinal, o que é que a gente pode pensar de um país que arma uma sacanagem dessas? - Fernando Bonassi (O Amor é uma Dor Feliz)
Expectativa, dúvida, angústia, receio, temor, abondono, incerteza, tensão, indefinição, solidão, preocupação, desolação, travação, isolação, indigestão...

No dia sete de janeiro, dia da primeira prova, tinha me transformado num perfeito idiota, ou, mais exatamente, num vestibulando de segunda fase completo. Olhava pras coisas e só enxergava átomos, fazia cocô e só via reações químicas, lembrava do meu avô caindo de bebado e tratava como um problema de Física, assistia tevê e lia jornal pensando nas mais loucas implicações históricas do que acontecia, tomava medidas, multiplicava, extraía raízes...

Entramos no local do exame com aquela alegria de gado em fábrica de salsicha. As expressões eram ainda piores que a primeira fase. Como havia só tres babacas por vaga agora, cada um imaginava que justo aquele que estava sentado ao seu lado era o cara que ia pegar o seu lugar.
Pairava em torno, junto com uma névoa de desesperança, um ódio de 220 volts. - Fernando Bonassi (O Amor é uma Dor Feliz)

Os cursinhos costumavam afixar na porta as listas com os aprovados no dia anterior à publicação dos jornais.(...) De repente a porta do Subjetivo se abriu e uma servente começou a colar as folhas de papel no lado de fora da porta.(...) Só que de repente todo o senso de humor tinha sumido do lugar. Os caras se aproximavam do papel como se fossem tomar um choque. Pra maioria o pior se confirmava. Procuravam seu sobrenome da posição da letra. (...)
Procuravam em todas as letras, mas nao era engano droga nenhuma. De cada trinta caras que começavam, vinte e nove eram massacrados. Nem a lei da selva era tao escrota com os animais. - Fernando Bonassi(O Amor é uma Dor Feliz)





Fernando Bonassi (1962) é um escritor, roteirista, dramaturgo e cineasta brasileiro. Nasceu em São Paulo.